Uma questão de anato[M]ia

      Não sabíamos bem como começar este artigo. Já nos aconteceu antes, aliás, mais vezes do que possam pensar, mas aqui neste caso não é pelas mesmas razões. Não é por não sabermos o que escrever ou por querermos ser mais irreverentes no arranque do texto. Talvez seja por termos visto a maioria dos vídeos do Youtube sobre este M4 Competition de forma a apreciar melhor a forma como é analisado, para tentarmos canalizar o nosso «discurso» de uma forma diferente dos demais. Mas… em determinados carros que trazemos aqui, talvez pelo fator irreverência, a nossa análise é traída pelo entusiasmo ou pela vontade que temos de provar ou contradizer tudo aquilo que já foi dito. E isso vai ser evidente neste artigo pois os novos BMW, em especial os serie 3 e 4 têm sido alvos de muita conversa sobre os «rins» do pára-choques da frente. Mas temos de voltar a usar uma daquelas célebres frases que são conhecidas como ditados: «primeiro estranha-se e depois entranha-se».

     Damos a mão à palmatória sobre esse mesmo ditado: não conseguíamos perceber o que tinha passado na cabeça dos designers da marca para dotarem os novos modelos da marca bávara de tamanhos adereços mas, e em abono da verdade, nos modelos M justifica-se bem pois é por ali que os dois turbos respiram o que nos leva a aconselhar a BMW a renomear os referidos orgãos de «rins» para «pulmões» não só pela função como também pelo formato dos mesmos. Mas deixemo-nos de anatomias e vamos ao que interessa. Para centrar o assunto e vos colocar a par, o Nuno Gomes da Second Skin Design e o Eduardo Martins da Garagem 87, nosso parceiro, colocaram as mãos no primeiro M4 Competition matriculado em Portugal (e que partilha garagem com excelentes peças, como podem ver no perfil do IG do 13carcollection) e se há algo que gostamos é de novidades; assim, logo que soubemos disso, rumámos até à Sobreda para espreitarmos este «puro-sangue» (palavras da BMW). E confessamos que mal o portão da loja se abriu e olhámos para a frente deste M4 que a nossa opinião mudou! Sim, este M4 até é engraçado.

     Talvez «engraçado» não seja a palavra mais correcta para descrever este M em todo o seu conjunto pois a palavra pode ser mal entendida no sentido de lhe expressar alguma “fofura”. É que este M4 Competition é tudo menos fofo. É visceral, é cru e muito agressivo, no bom sentido. Numa altura em que as marcas estão focadas quase a 100% no downsizing e na eletrificação dos seus modelos, a BMW (que também investe nestas áreas) optou por manter o seu desportivo com detalhes puramente focados para a dinâmica e, apesar de termos um 6 cilindros em vês de um V8 como modelos anteriores, o coração é puramente a gasolina e com o recurso a detalhes mecânicos que deixam os petrolheads de sorriso bem rasgado, nomeadamente turbos (são dois neste M4) e claro, potência mecânica. E já que entramos neste campo, podemos já riscar isto da lista dos detalhes a referir neste artigo: os números e pormenores mecânicos deste M4.

      São mais 30 cavalos que o M4 normal, passando para os 510 cv. O binário também aumentou para 650 nm, o que impele este BMW até aos 290 km/h (limitados – pack M Drivers que aumenta 40 km/h ao limitador). Este 6 cilindros em linha é um dos mais poderosos do mundo atualmente e conta com gestão eletrónica inteligente. No caso do Competition, o motor está acopolado a uma (e única) caixa automática ZF que permite utilizar o launch control e cumprir os 0-100 km/h em apenas 3,9 segundos o que parece que deixou a BMW chateada dado que já anunciou que irá lançar uma versão de tracção integral que, obviamente, será mais rápida neste sprint. E as novidades destes M não terminam aqui. Anos e anos de pedidos dos fãs da marca alemã parece que surtiram efeito e irá aparecer uma versão ainda mais familiar do M4, um M3 stationwagon. Se isto não vos provoca um pequeno frenesim, então estão no site errado!

      Mas voltemos ao M4 Competition que aqui temos que é isso que interessa. Não obstante das versões anteriores serem um bom exemplo do que se faz de melhor na área dos desportivos, este novo modelo é muito superior. É como que se a BMW andasse estes anos todos a fazer pequenos ensaios para a peça final não só em termos dinâmicos como mecânicos e até de design. Mesmo por cá na AWP a opinião relativamente ao aspecto deste BMW M4 não é consensual. Mas continuamos a defender o que escrevemos no início, que é preciso ver ao vivo para mudar de opinião. Aliás, quer em vídeo, quer em fotografias, este M4 parece «magro», esguio e tem um ar menos robusto que o antecessor, apesar de todo o restante pacote de ingredientes fazerem deste M4 um verdadeiro puro-sangue, que só não é uma invocação dos tempos anteriores por não ter um ruidoso V8 debaixo do capot. Mas também não precisa de um.

      No que concerne ao aspecto, que é aquilo que mais discussão provocou (e ainda provoca, até nos recentes retornos às esplanadas) é a frente. São os tais rins que nós agora chamamos de pulmões e que são para alguns oversized para o carro em questão. Mas isso resolve-se facilmente, basta terem atenção a dois detalhes: o primeiro é escolher a cor certa; acreditem quando vos dizemos que este M4 numa cor clara fica menos aprazível à vista. Já em cores mais escuras como preto ou cinza antracite, o contraste menor ajuda ao agradar das vistas mas para nós, a cor certa e perfeita para este M é este Estoril Blue, uma tonalidade única, profunda e que ressalta todos os ângulos e curvas deste coupé. E ainda por cima, tem o nome do «nosso» circuito favorito, o que podemos pedir mais? O segundo detalhe e que já não depende da cor em si é… bem, não usarem matrícula à frente! Mas se forem mandados encostar pelas autoridades, não digam que foi a AWP que sugeriu, que não temos advogados bons o suficiente para safar a coisa.

      E dado que ainda estamos na área da estética e em especial da bonita cor que este M4 tem, inserimos no artigo o que foi feito pelo Nuno e pelo Eduardo da Second Skin Design  (instalador certificado) e da Garagem 87, respectivamente. Não se iludam, os carros novos parecem «novos» no stand mas quando nos aproximamos há sempre coisas a melhorar, nomeadamente defeitos que surgem no transporte ou da curiosidade de quem o vê no stand e tem o síndrome de «ver com as mãos». Mas como tudo é solucionável, eis que este par de mestres arregaçou as mangas e meteu mãos ao trabalho, recuperando e corrigindo a pintura recorrendo a produtos da Gyeon. Depois disso, foi altura de criar uma capa duradoura e resistente com PPF (paint protection film) Premium Shield Elite SH não só no exterior como também nos carbonos do interior, protegendo-os não só contra as agressões físicas como também contra os raios UV. Agora este M4 está pronto para atacar o asfalto e espalhar a magia da letra M.

      Apesar da frente ser pouco consensual, a BMW tem um opcional que ajuda a embelezar este M4. O pack carbono adiciona as entradas de ar na frente em carbono e isso, juntamente com o logo M4 Competition em preto e as generosas grelhas também em preto, criam uma assinatura mais agressiva e desportiva, fazendo até os menos fãs deste M olhar duas vezes e expressar um «meh, até não fica mal». À segunda passagem do olhar, já gostam! Aliás, é isto que é a arte automóvel, causar tumulto e conversa sobre algo, impelindo emoção e contovérsia e no fim, transformar opiniões em opções. Pena que os mais de 160 000€ que este BMW M4 Competition custa não ajude muito na tomada de decisão pois a aquisição deste M é puramente emocional. Felizmente há quem tenha possibilidade de colocar este tipo de automóveis na estrada, dando oportunidade de ver, fotografar e admirar tal peça.

       E não, ainda não acabámos este artigo. A lateral esculpida pelo túnel de vento da marca da hélice tem uma silhueta próxima da perfeição e a anulação dos cromados que também fazem parte do tal pacote dos carbonos e etc dá-lhe um ar mais furtivo. As jantes de 19 polegadas na frente e 20 atrás tentam (mas não conseguem) esconder os enormes travões carbocerâmicos da M Performance que no eixo dianteiro têm quase 400 mm de diâmetro. São provavelmente maiores do que as jantes que vocês têm no vosso carro e não acusam fadiga, aliás tal como o Diogo disse no vídeo da Razão Automóvel (que colocamos no fim deste artigo), não se conseguem cansar. Por muito que puxemos por eles em estrada, estão sempre prontos para suspender a velocidade e dá-nos confiança para atacar as curvas e rectas de uma forma ainda mais agressiva. Os espelhos retrovisores também são em carbono e os faróis e farolins criam uma assinatura luminosa única e já habitual na marca, nos últimos modelos.

     Atrás as tradicionais quatro ponteiras marcam a presença e são, literalmente, o foco da atenção. Generosas e ruidosas, estes quatro «canos» facilitam a expulsão dos gases produzidos pelo 6 cilindros em linha e juntamente com o difusor em carbono que atravessa toda a traseira, mostram a quem vem atrás e tenha a sorte de o conseguir acompanhar que este BMW não é um simples serie 4, algo que noutros ângulos pode causar alguma distracção aos menos atentos. No topo da bagageira temos um pequeno lip em carbono (obviamente) que apesar de parecer apenas decorativo, acrescenta meia dúzia de quilos à força descendente na traseira e todas as gramas são importantes para manter a traseira minimamente controlável quando se conduz de faca-nos-dentes este M4.

     O interior é como entrar na penthouse do Sheraton se esta tivesse carbono em vez de mármore. É um local muito interessante de se estar onde o luxo que a marca alemã costuma impor nos seus modelos é completado pela desportividade e até irreverência do departamento desportivo da marca. Aliás, basta abrir a porta para perceber que este BMW está puramente concebido para dar aos seus ocupantes uma experiência ao volante (e à pendura) completamente visceral e puramente irrepetível. E sim, voltamos a abrir a porta para ver o logo M4 iluminar-se nas brutais (sim, é a palavra certa) baquets em carbono que são opcionais (são 3000 € a mais na fatura e 20 kg’s a menos no peso) mas que têm um design que nos deixou boquiabertos. Com aberturas, zonas pronunciadas e uma mistura de materiais, contam com aquecimento, memórias e rebatimento elétrico, são totalmente ajustáveis e principalmente, permitem a posição de condução perfeita. Confortavelmente sentados, temos o volante M revestido a pele e carbono com todos os botões e manípulos importantes e necessários para comandar tudo (praticamente) neste M4. Temos patilhas para trocar as mudanças, temos os M1 e M2 (memórias de modos de condução e opções de conforto), temos botões para o sistema de infotainement e até temos manípulos para os piscas (brincadeirinha).

        O conforto a bordo é bom, não é perfeito (para isso a BMW tem o serie 7 ou 8) mas é o suficiente para fazer um par de centenas de quilómetros de forma tranquila, apertando com o pé direito de vez em quando e mantendo a higiene da coluna enquanto o fazemos. Apesar do componente desportivo e vincadamente agressivo, este M4 acaba por se imiscuir no segmento dos GT’s, conseguindo levar 4 adultos (desde que os que vão no banco traseiro não sejam muito altos) com conforto suficiente ao longo de viagens de média duração. Mas honestamente, quem compra um M4 destes quer é desfrutar do prazer de condução ao invés de andar a fazer de Uber para os amigos. Pode sempre colocar um deles à pendura enquanto faz uns drifts (sim, existe um modo de avaliação de drift, memorizando settings, distância percorrida e até ângulo de viragem das rodas) ou então enquanto se faz uma serra e se tenta assustar aquele amigo mais afoito mas no geral este BMW M4 Competition é um verdadeiro desportivo.

         Sim, primeiro estranha-se, depois entranha-se. Leva-nos a desafiar o convencional da estética automóvel e causa-nos algum desconforto na medida que temos de «engolir» as palavras que dissemos quando vimos as fotos de lançamento ou as que foram tiradas pelo amigo num salão automóvel. Mas este M4 é um verdadeiro M, um automóvel pensado pura e simplesmente no prazer de condução. É um automóvel de série, é um facto, mas «sabe» a versão limitada, tal não é o detalhe e cuidado que a marca depositou na sua concepção. O interior digno de quadro exposto no Louvre e a dinâmica apurada, o motor extremamente redondo e potente, a definição de condução com uma direcção precisa e pesada q.b. que nos dá 200% de informações ao volante faz deste M o melhor feito até hoje! E não, não somos os únicos a dizê-lo e não nos vamos alongar, pois para completar tudo o que escrevemos, temos o Diogo da Razão Automóvel com a sua review a um irmão «quase» gémeo deste M4.