No Garage Queen here!

       Começamos este artigo com a conclusão que habitualmente fazemos no fim (obviamente): este é um Porsche para ser conduzido, não para estar a embelezar uma garagem. Daí o título deste artigo pois realmente este 997 GT3 não é uma Garage Queen. É usado e abusado em pista ou em estrada de serra, sempre com a premissa de fazer uso de todas as capacidades dinâmicas que fazem deste Porsche um dos melhores modelos que a marca fez. Sim, pode parecer algo redundante pois cada Porsche que sai parece ser melhor que o anterior e depois deste 997, já saíram duas versões da sigla GT3 mas já vos explicamos o porquê de tão ousada mensagem. Ainda não sonhávamos que iríamos passar pela provação que está a ser esta pandemia quando se falou em fotografar este 911, depois de nos cruzarmos com ele num trackday no Autódromo do Estoril onde partilhava a box com um GT2 também da geração 997 que contamos em breve trazer até vós.

       Quando este 997 saiu para o mercado nos finais de 2006 mostrou um carro focado para pista mas com alguns luxos e confortos que não eram incluídos na versão anterior 996, mais cru e virado para a utilização meramente desportiva. No entanto, a Porsche acreditou que ao colocar alguns extras neste 997 GT3, podia aumentar o leque de interessados, permitindo um uso misto, desportivo quando solicitado, mas também amigo do utilizador num quotidiano mais tranquilo. Claro que houve opiniões diversas e algumas mesmo mais depreciativas, ao dizerem que este GT3 era basicamente um Carrera S com «plásticos aerodinâmicos» e suspensão mais rígida. Ai como estavam errados…

       Sim, o GT3 tem suspensão adaptativa, tem ar condicionado, tem controlo de tracção e como é um Clubsport conta com pneus Michelin Pilot Sport Cup (semi-slicks) e espaçadores de 10mm de origem. Até pode ter GPS, pode ter tecto de abrir, pode ter cruise control, pode ter ainda bancos em pele e outras mordomias que há 15 anos atrás eram a epítome dos extras automobilísticos. Mas não é por isso que este GT3 perde o estatuto de carro focado para o condutor e para a experiência ao volante. É que convém relembrar os mais desatentos que este Porsche é fruto da casa desportiva da marca de Estugarda, de onde sai o GT3 RS, o GT3 Cup e o brutal GT3 RSR (este último fabricado nas instalações da Porsche Motorsport, em Weissach. Portanto e logo à partida, o facto do desenvolvimento ser feito a par das versões de competição faz com que todas os extras que possam ser adicionados não condicionem a vertente mais desportiva e crua deste modelo, até porque temos de olhar para este GT3 como olhamos para o GR Yaris do último artigo, como uma versão de homologação para estrada, dos modelos de competição.

         Não se iludam e não se «colem» à ideia que o GT3 é então completamente diferente de um Carrera 4 ou S; não de todo pois os GT3 nascem do chassis do Carrera 4 mas a mão mágica da divisão desportiva intervém e transformam um simples 911 numa máquina devoradora de alcatrão. Os materiais utilizados são leves e de competição por toda a carroçaria, nomeadamente nas portas e capot frontal onde recorrem ao alumínio, já na tampa do motor é utilizado um compósito plástico com menor peso e maior resistência à torção (onde temos a distinta asa traseira regulável manualmente) e até temos vidros mais finos do pilar B para trás. Todas estas inovações conferem ao 997 GT3 menos peso (5 kg’s com extras, mas só o sistema de AC pesa cerca de 20 kg’s) e melhor componente torcional (40%) que o «diabólico» 996 GT3.

        E como temos feito, continuaremos a comparar este 997 GT3 ao anterior 996 dado que é o seu substituto. Na versão anterior, tínhamos 375 cavalos; agora, graças a um rigoroso programa de exercício físico no 3.6 L atmosférico, este 997 debita uns saudáveis 415 cavalos às 7600 rpm’s (que segundo o dono parecem bem mais, dado que consegue atingir os 330 km/h em autoestrada, na Alemanha, claro *cof*), 200 rpm acima. É aqui, neste intervalo de rotações, que o típico e tão conhecido som dos motor boxer surge e que nos encanta a cada troca de mudança, atribuindo a este 3.6 quase tanto carisma (e potência) quanto o motor turbinado colocado no 996 Turbo (que na altura em que este GT3 saiu, ainda não tinha substituto). Apesar de todas as alterações feitas neste motor, também o escape sofreu melhorias dado que são os utilizados nos modelos de competição, embora tenham silenciadores (obviamente). Com um motor mais performante e um escape menos restritor com válvula (e um segredo: um botãozito Sport que muda o mapa da centralina), este 997 precisa de uma suspensão que transmita ao condutor segurança e confiança ao volante. Temos a referida suspensão adaptativa PASM (Porsche Active Suspension Management) que permite juntamente com a adaptação de coils reguláveis em altura e com o controlo de tracção (herdado do Carrera GT) maior controlo nas derrapagens antes que se tornem descontroladas, mesmo quando a utilização da caixa manual de 6 velocidades se torna entusiasta mas antes que pensem que assim não têm diversão ao volante, este sistema pode ser desligado… à vossa responsabilidade!

       Este GT3 é a versão Clubsport, na cor de apresentação da Porsche e um dos primeiros a sair da fábrica e difere das versões «normais» nas adições viradas para  a competição, nomeadamente na presença de um extintor, cintos de seis pontos e um botão (kill-switch) que bloqueia e desliga a corrente da bateria, em caso de acidente. Também tem uma rollcage, bancos em carbono do Carrera GT (que pesam apenas 10 kg’s cada um) e travões cerâmicos de 380mm na frente e atrás. Apesar disso, alguns destes extras são já… «extras» da versão Clubsport, o que faz deste GT3 um dos mais equipados que existe a nível nacional. Honestamente e ao vê-lo parado no asfalto, parece estar pronto para um dia em pista num qualquer troféu Porsche, especialmente nesta combinação de cores/extras, com o seu aspecto limpo, simples, mas rente ao chão. Talvez o facto de parecer mais «magro» por não recorrer aos «ombros» largos do GT2 e do Turbo ajude a esta sensação de estar à espera da luz verde para competir.

      O Bruno, entusiasta da marca alemã e dono deste GT3, conhece bem o mundo da Porsche. Já teve um Boxster GTS, adora os 993 e ainda existe um GT2 ao lado deste branquinho de Estugarda. E como entusiasta que é, não esconde a admiração que tem pelos modelos da marca e gaba-se, com razão, de ter um vasto leque de informações sobre estes modelos que curiosamente, já o ajudaram em determinados encontros com as autoridades. É que isto de se andar de GT3 na rua pelos vistos não é uma «ciência exata» e a rollcage e as baquets fixas os cintos de seis pontos e o rolar baixinho chama a atenção e faz com que o Bruno dê algumas lições de automobilismo a quem tenta autuar por estas referidas «coisinhas fofas» que este Clubsport tem.

      No entanto, nada disto importa quando se está ao volante. Este Porsche é uma verdadeira máquina de caça quilómetros e entrega toneladas de sorrisos por cada um que percorre. O som envolvente, a forma como sai de cada curva e o já conhecido nose-float (levantar da frente em aceleração) é tão distinto quanto entusiasmante. O motor, apesar de não estar carregado de potência como os modernos Porsche, tem a dose certa de binário para soltar facilmente a traseira durante metros e metros de curva tornando-se uma delícia de manter as RPM’s na faixa média, enaltecendo os dotes de barítono do flat-six. Mas a piada está acima dessa gama de rotações, com o pico de entusiasmo motor nas 7000, onde o motor boxer ganha uma vida totalmente diferente. É a experiência Porsche, que sentimos grande dificuldade em expressar por palavras, honestamente.

         E portanto, não. Este GT3 não é para estar parado numa garagem climatizada a ganhar anos de colecção, para depois ser apelidada de Garage Queen. Muito menos é objecto de decoração ou um caro e grande pisa-papéis. É um Carro (com C grande), um automóvel que chama por nós, que nos sussura ao ouvido palavras marotas como «conduz-me violentamente» ou »se maroto ao volante»… É um verdadeiro exemplo de perfeição sobre rodas. Claro que 14 anos depois, há mais e até melhores automóveis, mas é assim a evolução desta área que nos dedicamos na All Wheels Photography. Contudo, é da história que muitos automóveis atuais dependem e se há modelo que envelhece na perfeição é o 911. Especialmente se for uma versão totalmente focada para a diversão ao volante e que coloca o condutor no topo da pirâmide de «cenas importantes». Apesar de mais civilizado que o 996 GT3, este Clubsport não perdeu a mística por ter ar condicionado ou controlo de tracção. Apenas criou condições para podermos colocar a palavra «perfeito» antes do seu nome: Porsche 997 GT3 Clubsport.