GR-ande Yaris

         Crescemos em torno de uma ideia de automóvel que vamos compilando na nossa mente. Usualmente, quando nos sentimos atraídos por um determinado modelo, há sempre uma razão para que isso aconteça; ou porque um familiar tem um, ou um amigo, ou então é porque vimos aquele automóvel numa exposição ou até num anúncio, ou simplesmente porque foi paixão à primeira vista. Contudo, numa era de automobilismo sustentável, aquela paixão à primeira vista vai sendo substituída por ideias pré-concebidas e promessas de menor consumo ou eficiência e claro, deixamo-nos levar pelas publicidades na televisão, pelos outdoors e pelo que os vizinhos e amigos conduzem. Mas back in the days muitas marcas criavam automóveis com único intuito de despoletar a paixão e vidrar os aficionados das marcas, principalmente quando tinham de produzir veículos de estrada em número suficiente para poderem entrar em determinada competição.

      Quem nos segue é, usualmente, da mesma faixa etária que nós e cresceu a ver o declínio do saudodo groupo B nos Rallys, ou a vibrar com as lutas constantes entre a Audi, Mercedes e Opel no DTM por exemplo, mas caiu em esquecimento que para que estes automóveis estejam a competir, seja necessário criar especiais de homologação, modelos civis, legais para a estrada que possuam uma grande percentagem de painéis e acertos mecânicos e dinâmicos semelhantes à versão de competição. Com toda a limitação nos variados leques de desporto motorizado, estas versões de homologação deixaram de fazer sentido para a maioria das marcas mas a Toyota voltou a fazê-lo, anos depois, cumprindo com a promessa do presidente da marca Akio Toyoda quando assumiu a liderança da marca – «A era dos Toyotas aborrecidos acabou!». Será verdade?

       Há pouco mais de um ano estávamos numa posição parecida, ao testar uma das promessas da marca, o Supra A90. E… bem, podemos dizer que estaríamos tão empolgados como para testar este Yaris mas na realidade, este pocketrocket estava a causar-nos mais entusiasmo e curiosidade que o Supra. Será por ser um produto integralmente Toyota? Ou por ser algo mais semelhante aos nossos próprios carros? Na realidade, ambos os produtos são dignos da frase de Toyoda que referimos no anterior parágrafo e ambos são justificativos do grande hype criado em torno deles. Mas não vamos prolongar-nos na comparação Supra / GR Yaris até porque nem têm comparação. Vamos ao GR Yaris mas antes de continuarmos, temos de agradecer à Toyota Portugal e em especial ao João Santos, amigo de longa data da AWP e que sempre que pode, nos orienta para estes testes e sessões muito interessantes.

        O GR Yaris é, sem sombra de dúvidas, um brinquedo. Feito para andar sempre a rasgar pela estrada, não gosta de ritmos lentos. Tem DNA puramente de competição e o facto de ter sido desenvolvido pelo ex-campeão de Rallys Tommy Makinen diz tudo sobre as pretensões deste pequeno desportivo. Assim, era óbvia a localização da nossa sessão bem como de alguns quilómetros feitos em ritmos mais acelerados, aproveitando a menor presença de pessoas devido ao confinamento – Sintra. Local de eleição para muitos dos testes feitos a modelos deste estilo, as estradas da Peninha e Lagoa Azul invocam os antigos traçados das especiais de Rally do distrito de Lisboa e é onde este GR Yaris se sente verdadeiramente em casa. Tanto que até pode provocar alguns conflitos gástricos se estivermos mais concentrados no ecrã da máquina fotográfica ao invés da estrada.

           O «nosso» Yaris é a versão Extreme Rally e difere da outra (Extreme Premium) não no preço, pois ambos custam ligeiramente menos de 50 000€ (e aqui temos de colocar um grande ponto de exclamação!) nem no motor, pois ambos são equipados pelo 1.6 T de três cilindros em linha e debitam 261 cavalos, ambos têm velocidade máxima de 230 km/h e ambos chegam aos 100 km/h após arranque parado pouco acima dos 5 segundos. A diferença principal está no público alvo e nos extras ou digamos, adições, que cada uma das versões tem. A versão Rally que aqui trazemos está mais focada para a condução mas na realidade, ambos são excelentes a entregar aquilo que está escrito no papel: diversão a montes! O «nosso» Yaris tem na frente duas entradas de ar extra,  para «arejar» a travagem e diminuir a fadiga, conta com jantes forjadas da BBS especialmente concebidas para este GR Yaris e as maxilas de travão estão pintados nas cores da Gazoo Racing, com discos de 356 mm (maiores que no Supra A90!). Por fim, e talvez a diferença mais expressiva do ponto de vista dinâmico e que coloca o R no Rally é mesmo a suspensão mais rigidas e 2 diferenciais autoblocantes (um por cada eixo) que fazem autênticos milagres no que concerne à forma como abordamos os caminhos mais sinuosos.

         E já que falamos de dinâmica e diversão, vamos lá! Dinamicamente é muito bom. É uma espécie de carrinho de linhas montado num carril e com uma fisga atrás, sempre a disparar. É difícil manter a cabeça longe do encosto quando se acelera a fundo, principalmente se arrancarmos com o LaunchControl que, a bem dizer, é preciso atinar com ele pois nunca nos permite arrancar da mesma forma. Em estradas de curva contra-curva, a forma como a tracção inteligente GR Four faz a gestão da potência é quase mágica e permite mesmo que as nossas mãos não tenham de fazer grandes correcções de trajectória, imprimindo um andar vigoroso onde outros levantam o pé de imediato. Em jeito de comparação, a última vez que sentimos isso foi a bordo dos Mitsubishi EVO 6 e 7 que levámos até à Serra de Montejunto, e creio que se fazemos essa comparação, este GR Yaris já merece um thumbs up.

       Travar também não parece ser problema para este nipónico, talvez também pelo baixo peso do conjunto completo, menos de 1300 kg’s que para um veículo de tracção integral, é fenomenal. Os travões que não parecem acusar fadiga ajudam a manter este Yaris no asfalto e aumenta a nossa confiança ao volante. E essa confiança começa no interior na posição de condução que apesar de ser alta (tal como nos carros de rally), nos permite ter a total percepção do que nos rodeia. O volante exclusivo do GR Yaris está numa posição perfeita e oferece excelente pega, juntamente com o seletor de velocidades que está uns cm’s acima do normal Yaris para que seja rápida a troca entre as 6 velocidades desta caixa. Idealmente acima dos 3000 rpm’s, o motor cheio deste Yaris pede para ser constantemente conduzido de «faca-nos-dentes» coisa que não é difícil de o fazer.

        Apesar de tudo o que tem de bom este pocket-rocket, há algumas coisas que nos deixam um pouco menos entusiasmados com este GR Yaris, principalmente no interior. A Toyota quando criou este carro fê-lo com o objectivo único de passarmos muito tempo dentro dele, a usufruir aquilo que de melhor tem para oferecer. Contudo, deve ter pensado que não haveria tempo para espreitar alguns detalhes que fazem ficar «menos bem» num carro de quase 50 000€. Sabemos que é um automóvel virado para a dinâmica e para a perfeita experiência de condução, mas existem alguns detalhes facéis de resolver que merecem menção. Os materiais do tablier são pobres no seu geral. O topo em borracha dá um aspecto «fixe» e um tacto interessante, mas ficaram apenas pelas zonas superiores. Nas portas, a alcântara é mandatória sem dúvida mas merecia mais contraste com uns pespontos no tom do carro ou nas cores da Gazoo Racing, por exemplo. Há plásticos no tablier que estão pintados e oferecerm aquele aspecto mais premium mas merecia também uma cor mais vibrante para serem notados. Mas o pior mesmo é o espelho retrovisor que devido à linha descendente do tejadilho para efeitos aerodinâmicos, impede que vejamos o que se passa para trás. Apenas conseguimos ver as marcas dos modelos que vêm atrás de nós – felizmente já existem kits aftermarket que ajudam neste problema, digamos. Talvez estejamos demasiado picuinhas nesta fase mas acreditamos que merece a menção.

       Uma das maiores críticas deste GR Yaris em vários vídeos e publicações tem sido o som. O motor tri-cilindrico não é o mais audacioso em termos de som, e a comparação com um aspirador zangado tem de ser feita. A Toyota sabia disso e dotou este GR Yaris de um sistema audio interno que replica o som do motor no habitáculo, de forma muito metálica e crua, tornando-se demasiado artifical na nossa opinião. Infelizmente também não nos podemos «agarrar» ao escape para dar aquele entusiasmo pois também estes estão «castrados» pelas limitações europeias. Na realidade, no interior ouve-se bem o Turbo a encher de forma bastante interessante e é talvez o som mecânico mais entusiástico que temos neste Yaris. Mas honestamente, são detalhes que podem ser resolvidos com peças aftermarket. Mas o que verdadeiramente interessa é a diversão ao volante e para isso, este Yaris dá 200%!

          Modos de condução? Sim por favor. Este GR Yaris tem 3 modos de condução que se definem com base nas percentagens de potência em cada eixo. No modo Track a potência está repartida entre cada eixo igualmente (50:50), na Sport é 30:70 (mais na traseira, claro) e a versão normal 60:40, com mais potência na frente para melhor consumo e conforto de condução. Mas quem tem um destes, apostamos que vai andar sempre em Track ou Sport! Mas independentemente do modo de condução, este Yaris proporciona ao seu condutor uma verdadeira experiência de rally, tanto que a Toyota montou um travão de mão verdadeiramente para uso em condução e não para estacionamento. Sendo mecânico, permite ser puxado vezes sem conta para ajudar a descrever curvas apertadas ou aquelas inversões de marcha à filme de acção.

    Esteticamente chegamos quase ao fim do artigo e certamente que não vamos dar nenhuma novidade que não tenham visto ao longo do artigo nas diversas fotos. A frente tem um ar bastante agressivo, culpa principal da enorme grelha central que alberga as tais entradas de ar para arrefecimento que já referimos antes. No perfil lateral é possível ver a tal linha descendente do tejadilho em plástico reforçado em carbono que condiciona a visão traseira e o destaque vai para o conjunto jante/travagem que já falamos antes. O que não falámos é que as portas e capot são em alumínio o que contribui para o peso-pluma deste GR Yaris; isto aliado à colocação da bateria na bagageira, sob o fundo falso, melhora a distribuição de peso o que contribui para a melhor condução.

        E com isto, já nos estendemos no texto e achamos que vocês querem é ver fotografias. Mas temos de deixar aqui uma espécie de conclusão pois ao reler todo o artigo, ficamos com a impressão que possam ter ficado a achar que não gostamos muito deste Yaris. Bem, na realidade o factor preço e os pontos menos bons em conjugação deixam qualquer um de pé atrás mas… e o «mas» é grande: este carro é um brinquedo. É para ser um automóvel de emoções fortes, para levar para a pista ou dar umas voltas ao fim de semana, mesmo na versão mais civilizada, a Extreme. Logo os pontos que referimos como negativos, digamos, não mancha em nada o que este GR Yaris é. É um carro muito «fixe», um verdadeiro brinquedo cheio de tecnologia e que nos transforma num Tommi Makinnen assim que nos sentamos. É fácil de explorar e de nos levar ao limite e mais facilmente nos cansamos nós que o próprio carro, é um carro de rally sem decoração e com matrícula e seguro para andar na estrada e honestamente, é uma excelente forma de tirar o «pio» a quem criticou a parceria da Toyota com a BMW para o Supra. Este sim, é um Toyota que ficará para a história como um dos melhores de sempre feitos pela marca nipónica.